4 de julho de 2019

Conheça a história dos criminosos mais famosos do mundo #3 - Lampião e Maria Bonita

Chegou a hora da terceira parte de nossa nova série de matérias sobre os maiores criminosos do mundo, aqueles cujo nome todo mundo conhece.
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Attributed to Benjamin Abrahão Botto, Domínio público, via Wikimedia Commons
Hoje vamos falar de dois ícones brasileiros, os primeiros de nossa lista, são eles Virgulino Ferreira da Silva, mais conhecido como Lampião, e sua esposa Maria Gomes de Oliveira, conhecida como Maria de Déa e, após sua morte, Maria Bonita.
Todos devem ter ouvido falar de Lampião e seus cangaceiros, mas ele foi herói, vilão, assassino? Leia essa matéria e descubra tudo sobre eles.

Benjamin Abrahão Botto, Domínio público, via Wikimedia Commons
A história de Virgulino já começa confusa, ninguém sabe exatamente quando ele nasceu. As datas mais citadas são 4 de junho de 1898, que é a data citada em sua Certidão de Batismo e 12 de fevereiro de 1900, que foi a data dita pelo próprio Lampião.
Seja como for ele nasceu na cidade de Vila Bela, atual Serra Talhada, no estado de Pernambuco, foi o terceiro de sete filhos de José Ferreira dos Santos e Maria Sucena da Purificação, uma família de lavradores e criadores. Ele passava seu tempo ajudando seu pai a cuidar dos animais de sua fazendinha.
Até os 21 anos de idade Virgulino tinha uma vida relativamente normal, registros de sua vida antes dessa idade quase não existem e não citam nada de importante, mas sabe-se que ele trabalhou como artesão nesse época.
Ao contrário de muitos naquele tempo Virgulino era alfabetizado e até usava óculos para leitura, características bastante incomuns para a região sertaneja e pobre onde ele morava.
A vida não era fácil no sertão, e para piorar sua família tinha uma disputa com outras famílias locais, geralmente por limites de terras. Em 1915 sua família foi acusada de ter roubado alguns animais da fazenda de seus vizinhos, os Saturninos, que eram ligados à oligarquia, em outras palavras eles eram alguém que você não queria enfrentar. 
Depois de certo tempo, os irmãos de Virgulino mataram alguns gados do vizinho em retaliação e foram perseguidos pela polícia. Na fuga, sua mãe não resistiu e a polícia matou seu pai.
Virgulino jurou vingança, ele estava cansado de viver como lixo, ele encarregou um irmão de cuidar dos irmãos menores e, com os dois mais velhos passou a percorrer os estados nordestinos, fazendo justiça com as próprias mãos. Rapidamente passou a integrar o grupo do conhecido cangaceiro Sinhô Pereira.
Mas o que era o cangaço? O cangaço foi um fenômeno do nordeste brasileiro em que os membros do grupo, chamados de cangaceiros, vagavam pelas cidades em busca de justiça e vingança pela falta de emprego, alimento e cidadania.
Em 1922, Pereira desistiu da vida de crime graças a um padre, e ele resolveu dar o comando do seu cangaço para Virgulino. No mesmo ano Virgulino matou o informante que entregou seu pai à polícia, e realizou o maior assalto da história do cangaço àquela altura, contra a Baronesa de Água Branca em Alagoas.
O bando de justiceiros invadia as fazendas, saqueava os comerciantes e distribuía com os mais pobres uma parte do que recolhiam. Essa fama de Robin Hood fez de Virgulino uma espécie de herói local para os menos afortunados.
Cinco estados faziam parte de suas andanças. Por onde passava, torturava e matava, deixando um rastro de destruição e crueldade.

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Não se sabe ao certo mas acredita-se que Virgulino ganhou o apelido de Lampião devido ao fato dele disparar várias vezes sua arma a noite, iluminando o caminho com suas balas, como se fosse um lampião. Pra fazer isso ele usava um truque, ele amarrou um lenço na peça que puxa o gatilho para trás e amarrou o lenço no cotovelo, de forma que quando ele acionava o gatilho, ao mesmo tempo armava a arma, isso permitia a ele atirar seu rifle como se fosse uma metralhadora. Isso no Nordeste até hoje se chama "pulo do Lampião".
Além do grupo principal, Lampião tinha o comando de diversos subgrupos paralelos, designando outros cangaceiros à frente, entre eles dois ficaram famosos, Corisco e Antonio de Engracia. 
No dia 1º de agosto de 1923, o bando sofreu sua primeira emboscada no município de Nazaré do Pico, em Pernambuco. O combate se deu na praça, com a ajuda dos civis nazarenos. Era o início da Força de Nazaré, a mais importante perseguidora de Lampião. Em 1926, estando em Juazeiro, no Ceará, Lampião é chamado para combater na Coluna Prestes e receber a patente de capitão, mas é enganado pelo governo, mesmo assim ele passou a ser chamado de Capitão por seus homens. Nessa época visita o Padre Cícero, de quem Lampião era muito devoto.
Mas a vida de Lampião ia acabar mudando um pouco, isso porque ele iria conhecer o amor de sua vida, Maria Bonita.

Benjamin Abrahão Botto, Domínio público, via Wikimedia Commons
Assim como Virgulino pouco se sabe da infância de Maria, ela nasceu e cresceu no povoado Malhada da Caiçara, que se localiza no município Paulo Afonso, na época município Santo Antônio de Glória, na Bahia em 8 de março de 1911. Filha dos pequenos lavradores José Gomes de Oliveira e Maria Joaquina Conceição Oliveira.
Com apenas 15 anos ela foi praticamente obrigada a se casar com o sapateiro José Miguel da Silva, conhecido como Zé de Neném, mas as brigas eram constantes e o casamento não deu certo.
Depois de cada briga, Maria Bonita buscava abrigo na casa dos pais. Em 1928 resolveu se separar do marido, mas naquela época a separação era algo inaceitável, principalmente se a ideia partia da mulher e não do homem. Mas em 1929 sua vida iria mudar rapidamente.
Em 1929, morando na casa dos pais, Maria conheceu Lampião, que em suas andanças passava com seu bando pelas fazendas da região. A atração foi recíproca. Baixinha, com olhos e cabelos castanhos, era considerada uma mulher bonita e muito determinada, o que chamou muito a atenção do cangaceiro.
Em meados de 1930, Maria Bonita passou a fazer parte oficialmente do bando de Lampião, se tornando então a primeira mulher na história do Brasil a ingressar no cangaço. A partir daí, mais de 30 mulheres participaram da vida do bando. A Bahia foi o estado que forneceu o maior número de moças ao banditismo do sertão nordestino, seguida por Sergipe, Alagoas e Pernambuco.
A fama de Lampião e seu bando era tanta que no mesmo ano ele foi matéria do jornal The New York Times que o comparou a Robin Hood e em 1936, seu cotidiano na caatinga foi fotografado e filmado por Benjamin Abrahão Botto.
Durante incríveis 20 anos, Lampião viajou com seu bando de cangaceiros sem serem capturados, todos a cavalo e em trajes de couro, chapéus, sandálias, casacos, cintos de munição e calças para protegê-los dos arbustos com espinhos típicos da vegetação da caatinga. Para proteger o "capitão" (como Lampião agora era chamado) e realizar ataques a fazendas e municípios, todos usavam sempre um poder bélico potente. Como não existiam contrabandos de armas elas eram em sua maioria roubadas da polícia e de unidades paramilitares. A espingarda Mauser e uma grande variedade de pistolas semiautomáticas e revólveres também eram adquiridos durante confrontos. A arma mais utilizada era o rifle Winchester. 
O bando chamava os integrantes da polícia de "macacos", uma alusão ao modo como os soldados fugiam quando avistavam o grupo de Lampião, "pulando" igual macacos. Lampião e seu bando atacaram fazendas e cidades em sete estados além de praticar roubo de gado, saques, sequestros, assassinatos, torturas, mutilações e estupros.
Sua passagem causava terror e indignação nos moradores, fato citado amplamente na imprensa local, mas apesar disso, Lampião e seu bando eram frequentemente protegidos por coiteiros, nome dado aos fazendeiros, pequenos sitiantes ou mesmo autoridades locais que ofereciam abrigo e alimentos aos bandos por um curto espaço de tempo nos limites de suas terras, facilitando o deslocamento dos cangaceiros pelo Nordeste e sua fuga das forças do Estado.
Durante os anos de cangaço, Lampião zombou das policias, do governo e das pessoas influentes. Escapava fácil das emboscadas, dos tiroteios e das armadilhas. Conseguia despistar os policiais usando várias estratégias diferentes, provando que ele era mais esperto do que a maioria dos criminosos da época. Uma delas era mandar o bando calçar as alpercatas ao contrário para deixar o rastro em direção oposta.
Lampião e seu bando também eram muito violentos, eles mataram um rapaz que sofria de problemas mentais e até chegaram a castrar suas vítimas, em 1930 ele matou 35 reféns, forçando uma cidade inteira da Bahia a se deslocar pra outro lugar.

Benjamin Abrahão Botto, Domínio público, via Wikimedia Commons
Lampião, provavelmente por ter nascido pobre, adorava se exibir, ele mesmo criou roupas para si e para o seu bando, caprichava nos detalhes, usava medalhas, muitos anéis, correntes de ouro, chapéu de couro, alforjes bordados e punhais de prata. Lampião usava uma roupa semelhante a dos batalhões militares e óculos, que o caracterizou, já que seu problema de visão ainda o impedia de ler sem eles.
Mas embora Lampião tenha durado muito tempo no cangaço, tudo chega ao fim, e o Bonnie e Clyde brasileiros estavam próximos dele.

Benjamin Abrahão Botto, Domínio publico, via Wikimedia Commons
No dia 27 de julho de 1938, o bando acampou na fazenda Angicos, situada no sertão de Sergipe, esconderijo tido por Lampião como o de maior segurança. 
Era noite, chovia muito e todos dormiam em suas barracas. A tropa chegou tão silenciosamente que nem os cães dos cangaceiros perceberam. Por volta das 5:00h do dia 28, os cangaceiros levantaram para rezar e se preparavam para tomar café, quando um cangaceiro finalmente deu o alarme, já era tarde demais. Não se sabe ao certo quem os traiu, mas naquele lugar tão seguro, o bando foi pego totalmente desprevenido. 
Quando os policiais do Tenente João Bezerra e do Sargento Aniceto Rodrigues da Silva abriram fogo com metralhadoras portáteis, os cangaceiros não puderam fazer nada. O ataque durou cerca de vinte minutos e poucos conseguiram escapar ao cerco e à morte. Dos trinta e quatro cangaceiros presentes, onze morreram ali mesmo. Lampião foi um dos primeiros a morrer, na verdade ele morreu antes mesmo da operação começar. Logo em seguida, Maria Bonita foi gravemente ferida. Alguns cangaceiros, transtornados pela morte inesperada do seu líder, conseguiram escapar. 
Bastante eufóricos com a vitória, os policiais apreenderam os bens e mutilaram os mortos, cortando eles em pedacinhos e expondo suas cabeças decapitadas e mumificadas, provando para o povo que no fim eles eram tão ruins quanto os cangaceiros.
Alguns historiadores dizem que Maria Bonita ainda estava viva, apesar de bastante ferida, quando foi degolada pelos policiais.
Eles apreenderam todo o dinheiro, o ouro e as joias. Um dos policiais, demonstrando ódio a Lampião, desferiu um golpe de coronha de fuzil na sua cabeça, deformando-a para sempre. Este detalhe contribuiu para difundir a lenda de que Lampião não havia sido morto e escapara da emboscada, porque a cabeça decapitada já nem se parecia mais com ele.
"Feito isso, salgaram os seus troféus de vitória e colocaram em latas de querosene, contendo aguardente e cal." Os corpos mutilados e ensanguentados foram deixados a céu aberto, atraindo urubus e curiosos. Para evitar a disseminação de doenças, dias depois foi colocada creolina sobre os corpos. Como alguns urubus morreram intoxicados pela creolina, este fato ajudou a difundir a crença de que os cangaceiros haviam sido envenenados antes do ataque, com alimentos entregues pelo traidor, que hoje acredita-se ser Pedro Cândido, uma das possíveis vítimas de Lampião que se voltou contra ele.
O Memorial da Resistência localizado em Mossoró no Rio Grande do Norte é um museu que retrata a história da única cidade nordestina a resistir à invasão do bando de Lampião. Percorrendo os estados nordestinos, o coronel João Bezerra exibia as cabeças, já em adiantado estado de decomposição, por onde passava, atraindo uma multidão de pessoas.
Primeiro, os "troféus" estiveram em Piranhas, onde foram arrumados cuidadosamente na escadaria da Prefeitura, junto com armas e apetrechos dos cangaceiros, e fotografados. Depois, foram levados a Maceió e ao sudeste do Brasil. No IML de Aracaju, as cabeças foram observadas pelo médico Dr. Carlos Menezes.
Do sudeste do país, apesar do péssimo estado de conservação, as cabeças seguiram para Salvador, onde permaneceram por seis anos na Faculdade de Odontologia da UFBA. Posteriormente, os restos mortais ficaram expostos no Museu Antropológico Estácio de Lima localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em Salvador, por mais de três décadas. 
Durante muito tempo, as famílias de Lampião, Corisco e Maria Bonita lutaram para dar um enterro digno a seus parentes. 
O economista Sílvio Bulhões, filho dos cangaceiros Corisco e Dadá, em especial, empreendeu muitos esforços para dar um sepultamento aos restos mortais dos cangaceiros e parar, de uma vez por todas, a macabra exibição pública. Segundo o depoimento do economista, dez dias após o enterro de seu pai, a sepultura foi violada, o corpo foi exumado, e sua cabeça e braço esquerdo foram cortados e colocados em exposição no Museu Nina Rodrigues novamente. 
O enterro dos restos mortais dos cangaceiros só ocorreu depois do Projeto de Lei nº 2.867, de 24 de maio de 1965. As cabeças de Lampião e Maria Bonita foram sepultadas no dia 6 de fevereiro de 1969. Os demais integrantes do bando tiveram seu enterro uma semana depois. Finalmente havia chegado ao fim essa macabra história... só que faltava algo.

Benjamin Abrahão, CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons
Apenas em 2018 um grande mistério foi resolvido, quem matou Lampião? Só 80 anos depois da morte do cangaceiro o mundo teria uma possível resposta pra essa pergunta.
Frederico Pernambucano de Mello, o maior pesquisador do cangaço brasileiro, fez a revelação em seu livro "Apagando Lampião - Vida e Morte do Rei do Cangaço". O pesquisador afirmou que o carrasco do Virgulino Ferreira da Silva foi o soldado alagoano Sebastião Vieira Sandes. A bala na verdade bateu na lâmina do punhal de Lampião e atingiu a região umbilical esquerda do cangaceiro. Lampião morreu antes do combate em si.
Sebastião, em uma virada irônica do destino, era o sobrinho-neto da Baronesa de Água Branca, uma das primeiras vítimas de Lampião e era um antigo companheiro de costura do marido de Maria Bonita. 
A revelação foi feita pelo próprio Sebastião a Frederico em 2013. Na ocasião, ele havia descoberto que tinha pouco tempo de vida por causa de um aneurisma inoperável e resolveu contar todos os segredos daquele dia, mas se ele estava mentindo ou não ninguém nunca vai saber.
Bom, agora sim, depois de 80 anos, a história dos reis do cangaço chegou ao fim, mas então, eles eram heróis ou vilões? O debate se lampião era herói ou vilão dura até os dias de hoje, e isso já faz parte de sua famosa lenda.

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